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Louise Piloto da Silva

O imóvel de moradia da família pode ser penhorado?

O ordenamento jurídico brasileiro, com base no Princípio da Dignidade da Pessoa Humana e no Direito à Moradia, tem dispositivos específicos para a proteção da moradia familiar.

A lei nº 8009/90 trouxe, em seu artigo , a positivação dessa proteção, veja:


Art. O imóvel residencial próprio do casal, ou da entidade familiar, é impenhorável e não responderá por qualquer tipo de dívida civil, comercial, fiscal, previdenciária ou de outra natureza, contraída pelos cônjuges ou pelos pais ou filhos que sejam seus proprietários e nele residam, salvo nas hipóteses previstas nesta lei.

Então, será que o imóvel de moradia da família pode ser penhorado? Podemos entender, portanto, que os requisitos para a proteção do bem imóvel sob a égide da Lei 8009/90 são: que seja o imóvel próprio e que nele residam os proprietários. Isso significa que, mesmo que os proprietários tenham dívidas de qualquer natureza, o bem de família não poderá ser penhorado para sua satisfação, restando ao credor buscar os demais bens em nome do devedor. Se a família, no entanto, for proprietária de mais de um bem que alega ser de sua moradia, a proteção recairá sobre o bem de menor valor.

Apesar de ter como principal objeto a proteção do eixo familiar, a instituição do bem de família pode ser aplicada inclusive para pessoas solteiras e sem filhos, bastando para tanto que ela resida no imóvel.

Porém, note que o art. da Lei 8009/90 traz uma ressalva, ao dizer “salvo nas hipóteses previstas nesta lei”, ou seja, previamente estabelece que há exceções a tal proteção legal. Veremos a seguir as exceções mais comuns.

  • O BEM DE FAMÍLIA E O FIADOR

Neste sentido, podemos estender ainda mais a discussão, pois o artigo , VII da Lei 8.009/90 prevê o bem de família do fiador em contrato de locação como exceção à impenhorabilidade, como se vê:

Art. 3º A impenhorabilidade é oponível em qualquer processo de execução civil, fiscal, previdenciária, trabalhista ou de outra natureza, salvo se movido:
[...]
VII - por obrigação decorrente de fiança concedida em contrato de locação.

O que se vê, nesta hipótese, é que, apesar de ser muito comum no diaadia, a fiança não é tão simples como parece, podendo trazer consequências jurídicas gravíssimas em caso de não pagamento dos alugueres. Note que o próprio devedor principal é agraciado com a proteção do bem de família, enquanto o fiador, devedor acessório, não conta com a mesma proteção legal.

Há, no entanto, novos entendimentos do STF (Recurso Extraordinário 605.709) que refutam essa previsão legal em caso de locação comercial, com base na ponderação entre direito à moradia X livre iniciativa, que vão de encontro com o entendimento jurisprudencial majoritário até então, baseados na súmula 549 do STJ, segundo a qual:

Súmula 549 - É válida a penhora de bem de família pertencente a fiador de contrato de locação. (Súmula 549, SEGUNDA SEÇÃO, julgado em 14/10/2015, DJe 19/10/2015) .

Essas novas discussões trazidas à baila recentemente pelos tribunais superiores e pelo STF trazem muita insegurança jurídica para a rotina forense, visto que não há uma uniformização jurisprudencial sobre o tema, de forma que essa pauta provavelmente permanecerá em debate ainda por um tempo, especialmente considerando que não há, no dispositivo legal, qualquer distinção entre locação comercial ou residencial, apesar de haver diferença quanto aos institutos jurídicos protegidos comparando as duas modalidades de locação.

Em suma, podemos observar uma divergência de entendimento do próprio STF. No Recurso Extraordinário 612.360, o STF entendeu pela constitucionalidade da penhora do bem de família do fiador, ressaltando que neste caso a discussão permeava locação residencial, e, portanto, foi entendido que a fiança funciona como estímulo ao direito à moradia. Por outro lado, no Recurso Extraordinário 605.709 o Supremo entendeu que a livre iniciativa decorrente de locação comercial não poderia superar o direito à moradia do fiador, e, portanto, não é possível penhorar o bem de família do fiador na locação comercial, sendo vencido o voto do relator na ocasião. Vemos, portanto, que o STF tem a tendência de criar uma distinção para os casos de locação residencial e comercial.

O problema é que a lei não dá abertura para interpretações. O dispositivo é claro e direto ao prever a penhorabilidade do bem de família do fiador em todo e qualquer contrato de locação.

  • BEM DE FAMÍLIA E DÍVIDAS PROPTER REM

Uma outra exceção trazida pela lei são as dívidas propter rem, ou seja, decorrentes da própria coisa e de responsabilidade de seu proprietário. Podemos citar como exemplos as dívidas de condomínio ou IPTU. Essa exceção vem prevista no art. 3º, IV:

Art. 3º A impenhorabilidade é oponível em qualquer processo de execução civil, fiscal, previdenciária, trabalhista ou de outra natureza, salvo se movido:
[...]
IV - para cobrança de impostos, predial ou territorial, taxas e contribuições devidas em função do imóvel familiar.

Da leitura do artigo podemos entender, portanto, que as dívidas oriundas do próprio imóvel tem o poder de afastar a proteção legal conferida ao bem de família, de forma que ele pode ser penhorado nessa situação.

Esse tipo de dívida merece atenção especial, pois os débitos de IPTU e condomínio são bastante corriqueiros entre os proprietários de imóveis e, no entanto, são casos excepcionais em que é permitida a penhora do bem de família. Perceba, o risco que um devedor de IPTU ou taxa condominial corre é muito maior do que o de devedores de quaisquer outros débitos cíveis e fiscais, por exemplo.


É muito importante estar sempre atento aos problemas decorrentes de dívidas contraídas, ou seja, às consequências da existência dessas dívidas. Informações sobre essas e outras exceções à proteção ao bem de família você pode obter consultando um profissional!


louisepilotoadv@gmail.com


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